sábado, 12 de janeiro de 2013

Cadeirão


cadeirão
(cadeira + -ão)
s. m.
1. Cadeira grande.
2. Cadeira grande de braços, geralmente estofada.Ver imagem = POLTRONA

Quer antes, quer depois do transplante, e para evitar a longa permanência na cama, era mandado da cama para um cadeirão. Um sofá de napa, por vezes em mau estado, pernas desiquilibradas, as rodas pouco estruturadas permitindo que em movimento tomasse caminhos inesperados,  por vezes transformava-se num verdadeiro instrumento de tortura. Para evitar, ou melhorar os edemas nas pernas e pés, além de sentado no dito cadeirão, os pés e pernas eram colocados numa posição mais elevada, transferindo para a coluna e bacia o respectivo peso, provocando dores. Sózinho não era capaz de me transferir do cadeirão para a a cama e o contrário, por outro lado, os auxiliares por si não tinham autonomia para fazer essa mudança, era necessário a autorização de um enfermeiro, que nem sempre estava disponivel, o que levava a prolongar, para além do suportável a estadia no cadeirão, prolongando a dor e o mal estar. Maldito cadeirão!  Se inicialmente aliviava, em breve torturava. As outras cadeiras ainda pior, suma a pau, onde os meus ossos não suportavam estar alojados, e as dores ainda eram piores. As cadeiras não eram estofadas, e se no cadeirão, que o era, sentia as dores em todo o corpo, nessas cadeiras, imagine-se...
Não havia solução para melhorar o conforto, nem para tornar a estadia menos penosa. Uma banqueta para pôr os pés (por vezes sabiamente escondida para evitar o seu desaparecimento), ou então uma simples caixote de embalagens de soro era o que ainda se podia arranjar de resto, improvisa-se. Não são  queixas são apenas constatações. Toda a gente fazia o melhor para tornar tudo mais fácil e agradável, mas como se diz, sem ovos não se fazem omoletes.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Agulhas

agulha
s. f.

1. Hastezinha metálica que serve para coser, bordar, fazer meia, malha, etc.
2. [Por extensão ) Ofício de costureira ou alfaiate.
3. Espécie de buril.
4. Instrumento para limpar o ouvido das armas de fogo.
5. Lardeadeira.
6. Aguilhó.
7. Ponteiro (de relógio, de bússola).
8. Fiel de balança.
9. Extremidade pontiaguda de obelisco, campanário, montanha, etc.
10. Cernelha.
11. [Enologia  Sabor picante e agradável de certos vinhos.
12. Alavanca com que se manobra o carril móvel que faz mudar de via (nos caminhos-de-ferro).
13. Esse carril móvel.
14. Instrumento de veterinária para unir cascos fendidos.
15. Instrumento de cirurgia para perfurar partes moles.
16. Ponteiro de manómetro.manômetro.
17. [IctiologiaEspécie de peixe escombrídeo azul.
18. [Ictiologia]  O mesmo que peixe-agulha.
19. Parte da dobradiça macho que entra no orifício da fêmea.
20. Percutor do fulminante nas armas de fogo.
21. Folha do pinheiro.
22. Cume da cernelha do cavalo
Entre os medos a ultrapassar estava o terror das agulhas. Agulhas nas seringas, nos cateteres, nas recolhas de sangue  em todo o lado as agulhas estavam presentes para garantir que os medicamentos penetram no nosso corpo, que o sangue sai das veias e das artérias, que anestesias se fazem, que os soros estão onde devem, que as "perfusões" "perfusionam". A nossa ligação ao mundo exterior é feita em grande parte com o recursos a estes pequenos, picantes e penetrantes instrumentos, as agulhas. O meu medo das agulhas sempre foi grande, levando quase ao desmaio, não apenas quando são utilizadas em mim mesmo, mas também nos outros, mesmo quando observava na televisão alguém a utilizá-las. Era "epidérmico", uso subcutâneo, intramuscular, intravenoso, em diversas cambiantes, as agulhas sempre me atormentaram. Agora ía ter de me habituar sem reticências ao seu uso, sendo que agora até as aplico a mim mesmo, quando necessito de injectar a insulina.


Os primeiros tempos foram complicados. Todo eu tremia perante a expectativa de ser "picado". Procurava não olhar para não sentir. Depois pensava numa praia longínqua, no horizonte de um mar, numa praia, para que o meu espírito pairasse o mais longe possível,  do local onde a agulha e a veia se íam encontrar, qual ferrão de uma abelha. Tudo me atormentava, mas aos poucos habituei-me, e as picadelas sucediam-se todos os dias, em diversos locais do corpo, do pescoço, às virilhas, com os mais diversos pretextos, em veias, artérias, musculo, pele. Procurava não pensar muito no assunto evitava dramatizar e entregava-me de corpo e alma à imperiosa necessidade. Impunha  a mim mesmo, cerrava os dentes, fechava os olhos, o medo já não era da dor, que nalguns casos era pequena (mas nem sempe), pois cateteres nas mãos por exemplo, eram um suplício. mas parece que o medo era da própria agulha, e da perspectiva da sua utilização.

Acabei por ultrapassar, mas não aceitei nunca, ainda hoje, em que as picadelas escasseiam, os medos retornam, quando já nos esquecemos, quando já não estamos a contar, acabam por regressar quando parece que o inimigo já bateu em retirada as agulhas regressam e querem de novo tomar a iniciativa, quando me acham esquecido, distraído, de costas voltadas, quando parece que já me rendi.